Marquês de Sade
Contos Proibidos do Marquês de Sade


Quem nunca ouviu falar em sadismo? 
O filme, Contos Proibidos do Marquês de Sade (2000), do diretor Philip Kaufman, trata da história do escritor e filósofo francês Donatien Alphonse François de Sade, o Marquês de Sade, do qual é derivado o termo sadismo, muito utilizado para designar o prazer ou excitação gerados pelo sofrimento ou dor alheia. 

O filme retrata, sobretudo, a forma escandalizante com que o escritor apresenta suas obras, no momento histórico conturbado da Revolução Francesa (época em que a sodomia era crime na França), carregadas de "atos sexuais brutais e cruéis, descritos de forma primorosa e poética", muitas dessas ele próprio estava envolvido, sendo um dos motivos de sua prisão, lugar em que produziu grande parte de suas obras. O Marquês influenciou grandes artistas, escritores, cineastas, devido suas ideias originais carregas de desejos pervertidos. 

Sade possibilitou o advento de novas ideias, principalmente no que tange a sexualidade, corroborando para diversas reações sobre a temática. Algumas feministas da época "repudiavam com veemência a visão que o escritor tinha das mulheres, outras, elogiam sua obra, que segundo elas aborda a liberdade sexual de ambos os sexos, ao se recusar classificar as mulheres apenas como máquinas reprodutoras e lhes dá a liberdade de se tornarem seres sexuais", lançando, assim, a hipótese de que "o escritor tratava a sexualidade como uma realidade política".(Welldon)

Segundo o DSM-IV, o sadismo se configura como "uma atividade em geral sexual que visa provocar dor em outras pessoas e dar satisfação sexual àquela que inflige a dor". Para a psicanálise a perversão diz respeito a uma atitude sexual, o que não significa uma atitude genital, logo, os atos pervertidos não necessariamente estão ligados ao ato sexual propriamente dito. Devemos levar em consideração que, para Freud, a sexualidade humana já teria uma predisposição a perversão, o que chamamos, ainda na infância, de perverso polimorfo (que extrai prazer de diversas áreas do corpo).

"Nos Três ensaios, Freud fez da neurose “o negativo da perversão”. Com isso sublinhou o caráter selvagem, bárbaro, polimorfo e pulsional da sexualidade perversa: uma sexualidade infantil em estado bruto, cuja libido se restringe à pulsão parcial. Ao contrário da sexualidade dos neuróticos, essa sexualidade perversa não conhece nem a proibição do incesto, nem o recalque, nem a sublimação" (Roudinesco).


Posteriormente, Freud, repensa a perversão retirando-a do campo das perversões sexuais. Ao teorizar mais profundamente sobre tal mecanismo, chega a conclusão que a perversão já não seria mais apenas referente a uma predisposição da sexualidade polimorfa infantil da sexualidade,  mas o resultado de como o sujeito se posiciona diante da experiencia de confrontação da diferença sexual. Assim, a perversão, para a psicanálise não dispõe de uma conotação perjorativa, como se percebe no senso comum, carregada de juízo moral, ainda que "os comportamentos, as práticas e até as fantasias que o termo engloba só possam ser apreendidos em relação a uma norma social que, por sua vez, induz a uma norma jurídica" (Roudinesco).

Falar de perversão em termos psicanalíticos dá "pano pra manga", por isso, aos que se interessam pelo tema, retornarei com muitos outros filmes que tratam da temática, que sem dúvida é instigante! rs!

Por Suiá Freitas de Queiroz


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Rapa Nui
Rapa Nui - Uma aventura no paraíso




      O filme Rapa Nui (1994), do Diretor Kevin Reynolds, faz uma leitura a respeito da vida dos povos que habitaram a Ilha de Páscoa num período anterior à chegada dos europeus, em 1680. Neste período duas classes dividiam a população da Ilha: os Orelhas Longas e os Orelhas Curtas, onde os segundos eram considerados “inferiores” aos primeiros, tendo que servi-los de todas as maneiras, uma vez que era da classe dos Orelhas Longas o grande rei, o chamado Homem-pássaro, que tinha poder e regalias sobre os demais clãs.

 A disputa pelo “título” de Homem-pássaro era realizada por meio de diversas provas, que incluíam: descidas de penhascos, nado exaustivo num mar repleto de tubarões até uma ilhota, onde eles deveriam pegar um ovo de uma espécie de pássaro. Quem primeiro retornasse, com o ovo do pássaro intacto, seria reconhecido como "Homem-pássaro, recebendo tais regalias e o reconhecimento do deus Hotu-Matua, um dos protetores da ilha.

 Na obra freudiana o totemismo, da época primitiva, é comparado às instituições sociais e religiosas de hoje, onde o totem denomina cada clã ou grupo menor, e cada classe (Orelhas Longas e Curtas) é subdividida por clãs denominada a partir do seu totem.

 Segundo Freud, o totem “via de regra é um animal (comível e inofensivo, ou perigoso e temido) e mais raramente um vegetal ou um fenômeno natural (como a chuva ou a água), que mantém relação peculiar com todo o clã. Sendo considerado o guardião do clã , “que embora perigoso aos outros, reconhece e poupa os seus filhos”, sendo estes, na obrigação sagrada, proibidos de matar ou comer seu totem.

 Na película, podemos analisar os deuses tão temíveis, representados pelas estátuas, Moais, como totem, aquele de quem tudo depende: a boa colheita, o “paraíso”, ou salvação, etc.

 Em Totem e Tabu, Freud vai nos apresentar uma característica fundamental do sistema totêmico, que foi o que mais o atraiu para pensar questões ligadas à psicanálise, trata-se da exogamia, proibição (tabu) de relações sexuais com membros do mesmo clã, ou mesmo totem, conseqüentemente do seu casamento, ou seja, da proibição do incesto, que na psicanálise é muito trabalhada na teoria do Complexo de Édipo, em que o primeiro objeto de amor da criança é a mãe (relação incestuosa).

 No filme, é considerado um tabu a relação sexual, logo o casamento, entre membros de classes diferentes (Orelhas Longas e Curtas), assim por se tratar de um tabu, que segundo Freud significa, por um lado, sagrado, consagrado, e, por outro, misterioso, perigoso, proibido, impuro (...) e que não têm fundamento e são de origem desconhecida, mas que para aqueles que por eles são dominados são aceitos como coisa natural”, sua violação precisa ser vingada, uma vez que ao ser transgredido qualquer uma das proibições o transgressor passa a ser também considerado impuro, proibido, pois coloca os demais membros do grupo na condição de tentados a transgredi-los também.

 Em Rapa Nui, o personagem principal, Noroinia, ao desejar casar-se com Ramana, membro de uma outra classe, estaria provocando os deuses, considerado um tabu, devendo competir pelo Homem-pássaro e ganhar a competição, pois só assim os deuses se acalmariam.

 Assim, competir pelo Homem-pássaro pode ser considerada uma forma de reparar a violação do tabu, pois como cita Freud: “algumas proibições tabu podem ser substituídas da mesma maneira ou, antes, sua violação pode ser reparada por uma cerimônia”.

 No filme, alguns outros tabus são apresentados, bem como na cena em que dois membros da classe Orelhas Curtas são pegues com pescado, que, no entanto, deve ser do Homem-pássaro Ariki-Man para benefícios de todos. A violação de tal tabu é bem conhecida por todos, o que fica claro na fala dos personagens: “jamais comeríamos um tabu, poderíamos morrer”. O que finda por acontecer, são mortos por tupã.



Freud nos traz também que, "uma pessoa que não tenha violado nenhum tabu pode todavia ser permanente ou temporariamente tabu por se encontrar num estado que possui a qualidade de provocar desejos proibidos em outros e de despertar neles um conflito de ambivalência. A maioria das posições excepcionais e dos estados excepcionais são dessa espécie e possuem esse perigoso poder. O rei ou chefe desperta inveja por causa de seus privilégios."

    Nesse contexto, podemos pensar a ameaça dos Orelhas Curtas em não mais fazer as estátuas, Moais, bem como suas reivindicações por parte da colheita, da madeira e pelo “direito” de competir pelo Homem-pássaro, como um tabu que foi quebrado a partir do momento que foi despertado nos membros dessa classe uma inveja da posição privilegiada dos membros da outra classe (Orelhas Longas).

     O autor ressalta que a violação de certos tabus deve ser punido, visto que se apresenta como um perigo social, que reside no risco da imitação que poderia levar à dissolução da comunidade, o que nos fica muito claro no filme com a “guerra” entre as duas classes, em que a classe discriminada revolta-se contra a classe do “rei”, constatando a idéia trazida por Freud de que “o tabu de um rei é forte demais para um dos seus súditos porque a diferença social entre eles é muito grande”.
No final do filme ao ser retratado na película a devoração do pai e a destruição da figura totêmica, colocando fim a horda patriarcal e por fim a colonização da Ilha, percebemos claramente o que foi tratado por Freud como “as mais antigas e importantes proibições ligadas aos tabus que são as duas leis básicas do totemismo: não matar o animal totêmico e evitar relações sexuais com membros do clã totêmico do sexo oposto”, pois só assim seria possível a preservação da vida em grupo.
           
por Suiá Freitas de Queiroz.








Sonata de Outono
Sonata de Outono





Sonata de Outono, filme de 1978 do diretor sueco Ingmar Bergman, retrata, através da experiência cinematográfica, a relação conflituosa entre mãe e filha, tema aparentemente redundante, que, no entanto, de tão familiar, provoca um incomodo difícil de descrever. Análogo a uma sessão de análise, “Sonata de Outono”, aponta tanto seus personagens como seus espectadores diante de um estranho desconforto, que como sugere Freud (1919, p.238), “é aquela categoria do assustador que remete ao que é conhecido, de velho, e há muito 
familiar.” 
Trata-se de um drama psicológico, de sensibilidade aguçada, sendo os seus diálogos carregados de poesia e simbolismos. Sonata de Outono traz o componente feminino, retratado pelas figuras da mãe, Charlotte, e da filha, Eva, como predominante, assim como da relação dolorosa e devastadora entre mãe e filha que está muito além de uma relação de cunho familiar, mas que se trata, sobretudo, de uma relação entre duas mulheres.  

Charlotte, uma mulher que se consagrou como pianista e que para alcançar tal objetivo fez-se ausente na sua função familiar tanto como esposa quanto como mãe. Uma artista completa e uma mãe faltosa caracterizam a personagem de Ingrid Bergman. Eva, protagonizada por Liv Ullman, uma mulher de aparência e gestos infantis, de olhar melancólico carregados de mágoas há muito guardadas de uma infância marcada por um amor incondicional e um ódio igualmente grande por sua mãe. É, portanto, sobre a intensidade do amor e ódio sem limites entre mãe e filha, que trata o filme de Ingmar Bergman.

O enigma sugerido por Eva e revelado por seu marido, logo no início do filme, ao ler um trecho do livro escrito pela esposa:  “Meu maior  obstáculo é não saber quem sou..."aponta o enigma sugerido por Freud referente ao não-saber histérico e  à  dificuldade de definição clara da mulher a sua identidade feminina, ou seja, da ausência de algo que lhe diga o que é ser uma mulher, além de anunciar a ausência de lugar diante do desejo do Outro, no caso, do desejo materno, uma vez que o filme se inicia com o endereçamento da filha Eva à mãe Charlotte, em forma de carta, numa suplência ao seu retorno, após sete anos de separação.
Após várias tentativas frustradas de sensibilizar e se mostrar merecedora do amor de Charlotte, que de tão superficial necessita o tempo todo ser reafirmado, como a si mesma, Eva a  acusa de tê-la deixado, assim como sua irmã Helena, completamente desamparadas quando ainda criança, dando início ao acerto de contas entre mãe e filha.
O que se percebe, em Sonata de Outono, é uma ambivalência na relação mãe e filha, que como sugere Freud (1931),é a regra nas primeiras fases da vida erótica, ainda que “poucas são as pessoas que não retêm esse traço arcaico durante toda a vida”, além da dificuldade sentida pela filha em separar-se da mãe,  ainda que seja um aspecto considerado crucial para o desenvolvimento da sexualidade de uma mulher.

A fase de ligação ou amor exclusiva da filha à mãe, chamada de fase pré-edipiana, tem para as mulheres uma grande importância, uma vez que é na relação com a mãe que a menina poderá encontrar uma identificação feminina, pois “é por poder viver-se mãe e mulher, sem abdicar de nenhum desses aspectos, pelos quais constitui sua feminilidade, que a filha pode encontrar um apoio para formar-se a sua feminilidade, distinta da de sua mãe” (ZALCBERG,2003).

Quanto à escolha de Eva por um marido que nunca amou e que nunca teria capacidade de amar, mas que sempre esteve ao seu lado na espera de ser minimamente correspondido, reflete a escolha de Eva por um homem ao modelo do pai, repetindo nessa relação o que era vivido pela mãe na relação conjugal.

Cabe considerar que “a  função paterna é aquela que destitui a criança da suficiência em que acreditava estar em relação à mãe e a confronta com a insuficiência  de seu ser” (VIVIANI, p.7). Dessa forma, havendo uma intervenção efetiva do pai, há uma eficácia da função paterna, esta eficácia é um corte na relação mãe e filha. No entanto, é o desejo da mãe que permite que o pai faça esse corte, que o reconheça como a lei, passando agora a ser ele o falo da mãe. De outra sorte, a forma com que o pai de Eva é apresentado no filme, como um homem submisso, que juntamente com a filha compartilhava a solidão da ausência de Charlotte, uma falta que não era só física, mas principalmente de afeto e que em nenhum momento a coloca como sendo objeto causa do seu desejo, contribui para sustentar a posição da mãe para a filha como toda fálica, assim, a falha na intervenção do pai nessa relação resulta na insuficiência de atribuir a Eva seu lugar de mulher. ressalta-se que para Freud (1931), a relação da menina com o pai não faz desaparecer a relação primária com a mãe, e o que se percebe em Sonata de Outono, é um grande afeto entre pai e filha, que se caracteriza muito mais por uma cumplicidade à ausência da figura da mãe e esposa,do que um direcionamento ao pai como substituição ao amor da mãe como objeto.  No entanto, seria essa substituição que permitiria a mulher encontrar o caminho para a feminilidade, ao trocar de objeto de amor, aceitando a castração e abdicando do objeto desejado – pênis – pelo desejo de um filho.

Nesses termos, a menina ao tentar tornar-se objeto de gozo materno, deixa suspenso o seu próprio  desejo. Eva ao colocar-se como objeto de satisfação de Charlotte, apresenta dificuldade em renunciar a esse lugar de gozo.

Diferentemente da alienação, que se apresenta como relação fundamental para o surgimento do sujeito, sendo, portanto, muito necessária, a separação não é o destino, pois, requer um querer, depende da ação do sujeito. A separação implica “uma vontade de sair, uma vontade de saber o que se é para além daquilo que o Outro possa dizer, para além daquilo inscrito no Outro” (SOLER, 1997). Portanto, “se o ressentimento de uma filha em relação à mãe a ajuda a separar-se da mesma, trata-se de um sentimento que precisa, como toda paixão, ser permanentemente reeditado” (ZALCBERG, 2003).

por  Suiá Freitas de Queiroz
                                         

Para baixar: http://www.fileserve.com/file/RShbCcf













       
Olá!

Nesse blog pretendo debater a teoria psicanalítica a partir de análise fílmicas, disponibilizando, a cada debate, o filme analisado para aqueles que, como eu, adoram cinema...e claro, psicanálise! Fiquem à vontade!